sexta-feira, 1 de julho de 2011

A descoberta do PI

Erathostenes c. 250 AC mediu um arco de meridiano terrestre de 5000 estádios e, usando um instrumento de forma semi-esférica ( chamado skaphe), verificou que esse arco de meridiano era proporcional a um arco de meridiano da skaphe, o qual media 1/50 do meridiano da esfera desse instrumento. Consequentemente, concluiu que o meridiano terrestre e' 50*5000 = 250000 estádios. Ou seja, em lugar nenhum precisou saber o valor do PI! Esse exemplo, e outros que poderíamos mencionar, mostram que é bastante surpreendente que a quase totalidade das pessoas ache que PI foi descoberto ao se relacionar circunferências com diâmetros dos respectivos círculos. Embora a definição usual do PI baseie-se na constância da razão circunferência : diâmetro, muito provavelmente não foi essa a origem do PI. Com efeito, é difícil imaginarmos situações práticas reais onde, numa civilização incipiente, alguém tenha precisado calcular a circunferência de um círculo de diâmetro conhecido, ou vice-versa. Muito mais naturais sao problemas requerendo achar a área de um campo circular em termos do diâmetro ou mesmo em termos da circunferência. Em verdade, devia-se até questionar se a descoberta do PI realmente ocorreu no contexto de círculos, e não no de esferas.

Essa inquietação não é só nossa. O famoso historiador matemático Abraham Seidenberg gastou muitos anos de sua vida vasculhando museus e lendo trabalhos de antropologia, em busca dos mais antigos indícios de envolvimento humano com círculos, esferas e o PI. O resultado desses estudos foi resumido nos seus artigos The ritual origin of the circle and square, Archiv.  Hist. Exact Sc. 25, (1981), e principalmente em On the volume of a sphere, Archiv. Hist. Exact Sc. 39, (1988). Sua conclusão foi que o cálculo do volume da esfera em termos de seu diâmetro remontaria a antes de 2 000AC, sendo anterior a matemática das grandes antigas civilizações mesopotâmica, indiana, chinesa e egípcia. O historiador matemático B. van der Waerden identifica essa origem com o que chamo de Tradição Origem da Matemática e a localiza no Vale do Danúbio c. 4000 AC. Segundo Seidenberg, nessa tradição também se teria reconhecido a igualdade da constante de proporcionalidade relacionando circunferência com diâmetro e área de círculo com quadrado do raio; ou seja, já nessa tradição, possivelmente lá por 3000 a 4000AC, se teria reconhecido que o "PI da circunferência" é igual ao "PI da área do círculo". Também é interessante observar que Seidenberg concluiu que a descoberta dessa igualdade usou métodos infinitesimais, ao estilo de Cavalieri.

Trabalhar com trigonometria, envolve certamente o trabalho com ângulos, e para cálculos e medidas decorrentes destes ângulos, certamente será utilizado o PI (3,141592...). Um dos desafios com que o Homem se deparou foi, sem dúvida, o cálculo do pi, que estava longe de ser um número normal. Este é um número de tal forma único que se viria a transformar no número mais famoso da história universal. A sua história fascinante teve início há cerca de quatro mil anos atrás e prolongou-se até a atualidade em que ainda são efetuados cálculos, usando computadores, ansiando bater o recorde de casas decimais determinadas. Note-se que, atualmente, já se calculou o pi com mais de 206 bilhões de casas decimais. Muito foi dito sobre o pi, mas afinal, em termos simples, o que é o pi?

O pi é a razão entre o perímetro e o diâmetro de qualquer círculo.
Na antiguidade, se usava a fração 22 / 7 em substituição ao PI. O resultado (3,142857143...) fornece uma precisão razoável. O valor de pi, com 10 casas decimais, é suficiente para a maioria das "aplicações" práticas. Ocasionalmente, existe a necessidade de aumentar a precisão dos resultados obtidos, contudo não se conhece um único caso, de uma situação prática que requeira o uso de pi com mais do que 100 casas decimais. Então, por quê calcular o pi com bilhões de casas decimais?
Uma das razões é a necessidade da resolução de problemas que se levantaram à volta desse número, a necessidade de o conhecer de uma forma mais aprofundada, isto porque, a natureza do número pi intrigou matemáticos desde o início da história da matemática. As propriedades mais importantes do pi, e que ocuparam muitos matemáticos, são a irracionalidade e a transcendência, que foram estabelecidas em 1761 e 1882, respectivamente. Contudo, resolvidas estas questões, no século doze, a tônica foi colocada num outro tipo de questões, nomeadamente, saber se o pi, apesar de ser irracional e transcendental, é normal. PS: Irracional, significa que o PI não pode ser expresso através de uma fração, ou seja, ainda não foi descoberta uma seqüência repetitiva nas casas decimais.
Os egípcios sabiam trabalhar muito bem com razões, ou seja, divisões. Descobriram logo que a razão entre o comprimento de uma circunferência e o seu diâmetro é a mesma para qualquer circunferência, e o seu valor é um número "um pouquinho maior que 3".
É essa divisão que hoje chamamos pi.

Por que é tão difícil calcular o PI?

A principal razão é que PI não é uma fração. Com efeito, se PI pudesse ser escrito como uma fração m/n, seu cálculo poderia
·       ou se resumir em buscar o valor de tais numeros inteiros m e n
·       ou explorar a periodicidade de sua representação decimal ( por exemplo, se fosse verdade que PI = 22 /7 = 3.142857 142857 142857 ..., então nos bastaria achar o valor da parte inteira, 3, e o bloco 142857 que se repete indefinidamente ).
O fato de que, por mais de 2000 anos, ninguém tivesse conseguido explorar nenhuma das duas possibilidades acima é exatamente o que sugeriu que PI não deva ser uma fração. A verificação rigorosa desse fato, ou seja a demonstração da irracionalidade de PI, veio só com Lambert, em 1761.aleatoriamente.
Em verdade, por si só, a irracionalidade de PI não seria suficiente para determinar a dificuldade de seu cálculo; com efeito, existem irracionais de representação decimal previsível, e então fáceis de calcular, como é o caso de 3.10110111011110... . PI é difícil de calcular porque é um irracional imprevisível: sua representação decimal não mostra nenhuma previsibilidade, sendo que acredita-se que seus algarismos se distribuam.

 

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